sexta-feira, 30 de maio de 2014

Darwinismo, a regra como exceção e vice-versa



O Vereador Carlos Bolsonaro postou no Facebook um paralelo entre um jovem negro que subiu na vida, se tornou um policial, foi morto em ação e um outro que se tornou marginal e acabou sendo torturado, amarrado a um poste.
Ele atribuiu os destinos diferentes ao "Livre arbítrio" considerando que eles estavam em condições iguais e, por uma questão de mérito deveriam ser premiados, criticou os esquerdistas em geral por não dar importancia ao sacrifício do homem de bem e apiedar-se do marginal.
O material é rico em paradigmas e merece uma análise cuidadosa dos fatos e conceitos.
Pensemos em termos de méritos, o soldado venceu as condições adversas que o cercava, e tornou-se um policial cumpridor de seus deveres, é claro que existem policiais assim, embora a policia militar em geral seja uma incubadora de psicopatas, e servidores públicos estúpidos, por isso não cai bem idealizar o rapaz, policiais mortos em ação podem muito bem ser alvo de queima de arquivo e/ou heróis a serviço da defesa do cidadão, a não ser que o filmes de ficção "tropa de elite" não tenha nenhuma base nos fatos. O marginal que também vivia uma vida miserável foi incapaz de fazer algo positivo e preferiu seguir o caminho mais simples, simplesmente pegar o que queria e quando queria, de quem quer que seja, sem se importar com as regras de civilidade.
Vou dizer uma coisa que qualquer conservador vai concordar, as pessoas não nascem iguais, a variabilidade genética do ser humano é responsável, em parte, por explicar porque duas pessoas em condições semelhantes tomam rumos tão diferentes. O que falta explicar é a frequência desses fenômenos.
A variabilidade genética é responsável por outros tipos de variabilidade, inclusive na da competitividade e da resiliência, com uma distribuição que tende a obedecer aos padrões da famosa curva normal.
O elemento chave está na dignidade da pessoa humana, todos sem exceção, querem a felicidade e satisfação de suas necessidades. Mas de acordo com a capacidade de cada um e de acordo com as oportunidade que o ambiente oferece, sempre haverão os que conseguem aproveitar mais e os que conseguem menos, no entanto, a civilidade humana não pode permitir que nenhum ser humano morra de inanição ou por descaso, que viva em condições degradantes e vexatórias. E principalmente, que seja impedido de progredir e adquirir competências e habilidades.
Os conservadores, valendo de da crença de que as pessoas não são iguais, lançam o conceito de "liderança natural" em que pessoas dotadas de excepcional domínio sobre as próprias condições obtém mais sucesso, tornam-se modelos e inspiração para os demais.
Os conservadores também tem sua própria definição de darwinismo social associado ao conceito de família tradicional, sim, "porque família é sagrado" (Dep. Cid Gomes, ao ser perguntado porque viajou com a sogra para a Europa às custas do erário) A meritocracia, nesse caso, ganha os parêntesis conveniente.
Dessa forma um morador de rua pode tornar-se um trabalhador com um lar e uma família. 
Um jovem de vida modesta pode se transformar em um profissional muito bem colocado em sua comunidade.
E um cidadão de classe média pode ampliar a fortuna de sua família, sendo um empregador ou negociante bem sucedido.
É claro que todos esses casos tem a marca do mérito pessoal, da excelência e da adaptação do sujeito às condições do meio em que vive. Esse meio define que tipos de habilidades são meritórias e melhor compensadas, e obviamente, cada ideologia politica sem sua própria ideia de como deve ser esse meio.
Mas a meritocracia conservadora tem um furo que a descaracteriza completamente, o direito à herança. Dai, aquele sujeito excepcional não vai transmitir seus genes integralmente à sua prole, nem mesmo pode garantir a eles, sua estatura moral e intelectual. A não ser ocasionalmente, um descendente rico será capaz de dar seguimento à escala de crescimento econômico da família, a maioria irá mesmo é usufruir dos bens acumulados sem, de fato, ter feito nada para merecê-los. Na média, as famílias apenas mantem a fortuna como está, os negócios em funcionamento e os privilégios garantidos.
Uma tese dos libertários de esquerda sobre o livre mercado reza que quanto maior a quantidade de bens que um indivíduo possua, mais ele precisará trabalhar e gastar para manter esses bens em segurança e trabalhará ainda mais para continuar acumulando, esse tipo de regra fundamental permite que as pessoas sejam desestimuladas a acumular uma grande quantidade de bens, e se atenham a acumular apenas o necessário ao seu bem estar e à sua segurança. Sabemos que as fortunas nababescas de hoje são motivadas por uma neurótica busca do enriquecimento, por um jogo sórdido de ostentação entre homens ambiciosos, de assaltos ao erário público, da exploração e espoliação de cidadãos tidos como livres, ou de esquemas do capital financeiro especulativo, constituem, em grande parte, em demérito ao invés de mérito. Sabemos também que coisas como o financiamento de campanhas politicas, ajuda financeira a bancos e outros empreendimentos, legislações restritivas e burocracia empresarial, brechas nas leis, estrutura tributária regressiva e a normatização injusta de transação dos ativos econômicos foram formatados para favorecer as grandes fortunas do mundo.
No caso de um mercado realmente livre, as regras justas iriam manter todos em um nível de enriquecimento ótimo que poderiam ser transmitidos como herança e ainda assim, não permitiriam aos herdeiros a vida mansa dos playboys que todos vemos nas revistas de celebridades. Ao mesmo tempo, a quantidade e a variedade de negócios e empreendimentos iriam garantir a largas faixas da população, um ambiente de múltiplas condições objetivas onde cada ser humano pudesse realizar uma atividade que lhes fosse viável economicamente e adequada às suas habilidades e limitações. As pessoas com grandes fortunas iriam minguar até o seu tamanho ótimo, enquanto promovem de maneira forçada, mas justa e espontânea a tão desejável distribuição de renda, ao sabor do próprio mercado, já que sem a ajuda do governo e sem competência suficiente, eles não teriam vantagem em um mercado realmente livre.
A renda distribuída iria necessariamente para os investimentos, novos negócios, consumo e poupança. A alta competitividade iria aumentar os salários e a variedade de opções, diminuir as taxas de juros e os preços das mercadorias. Isso geraria uma leva de oportunidades que permitiria até mesmo aos menos capazes tirar proveito do mercado, é claro que sempre haverão pessoas com um pouco mais que as outras, pessoas que tentarão enganar seus clientes e empregados, pessoas preguiçosas e/ou intelectualmente despreparadas, que sempre terão menos que os demais. As pessoas ao ver essas diferenças talvez esbocem, algumas mudanças de comportamento, e melhorem de vida mudando suas atitudes.
Sempre haverão pessoas refratárias aos novos tempos e situações que tentarão violar as regras sociais, em um mundo livre, os perversos terão pouca chance de sucesso, e todos terão a possibilidade de se realizar.
Os dois jovens que são alvo da minha análise não estão em um mercado livre, estão em um ambiente que nega oportunidade às pessoas, ao mesmo tempo em que oferece e ostenta as benesses da vida do primeiro mundo por um preço que pouca gente pode pagar, um pais que desde sempre, esteve com suas lideranças ocupadas demais com os negócios privados e ignorando a coletividade, que não educou seu povo para a autonomia.
Não fosse assim, talvez o jovem infrator sequer teria coragem de delinquir, para não ter que encarar cidadãos esclarecidos, generosos, solidários, e perspicazes. E o jovem policial por mérito, galgasse rapidamente os postos de liderança da corporação, ao invés de expor-se na rua por anos a fio.

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